Sentada em meu sofá, perplexa
eu assisti a votação da Câmara dos Deputados sobre o impeachment da presidente Dilma
Rousseff, no domingo, dia 17 de abril. Ouvindo aquele monte de baboseiras em
série, ditas por 100% de nossos “nobres deputados”, fiquei me perguntando de
que maneira colocamos aquelas criaturas medonhas para decidir sobre o futuro de
nosso país. Sobre o nosso futuro. O meu e o seu.
No entanto, o que mais me
angustia é que aqueles senhores e senhoras, que votaram pelas suas respectivas famílias
e pelo seu respectivo Deus, não estão onde estão porque deram um golpe. Nenhum
deles se tornou deputado tomando o poder à força. Todos, absolutamente TODOS
foram eleitos por nós, democraticamente. Ou seja: nós votamos neles por livre e
espontânea vontade.
Mas será mesmo?
Não vou cair no clichê de dizer
que não sabemos votar, nem que temos memória curta, e muito menos que somos tão
corruptos quanto nossos representantes. Isso já foi dito inúmeras vezes, e a
verdade, como sempre, é um pouco mais complexa do que simplesmente apontar o
eleitor como o culpado pela corja que nos governa, e sempre nos governou. O
buraco, meus amigos, é mais embaixo.
Porque, na minha visão, a democracia
brasileira é uma democracia parcial, altamente questionável. Segundo o dicionário
Michaelis, democracia significa “Influência do povo no governo de um Estado”. Concluímos,
então, que o povo é agente dominante e atuante de qualquer processo
democrático. Sem o povo, não há democracia. Mas e quando o povo possui imensas limitações
intelectuais, sociais e políticas? Este tal de processo democrático não se
torna, no mínimo, discutível?
Recentemente, saiu uma pesquisa
chamada “Analfabetismo no Mundo do Trabalho”, realizada pelo Instituto Paulo
Montenegro (IPM) e a ONG Ação Educativa. Segundo esta pesquisa, apenas 8% dos
brasileiros possuem plenas condições de compreender uma argumentação,
interpretar corretamente um texto, e opinar sobre o posicionamento de
determinado autor. Isto significa que, de cada cem pessoas que você conhece, só
oito são capazes de entender esta crônica, por exemplo.
Neste cenário, onde 92% da
população simplesmente não possui capacidade intelectual para compreender um
texto simples, eu pergunto: onde fica a democracia? O que ela significa
exatamente?
Some-se a isto a enorme e
acachapante pobreza e desigualdade social que assola nosso país, e que se
reflete diretamente em saúde precária e educação de péssima qualidade. O
resultado? Cidadãos intelectual e politicamente incapazes de diferenciar um
focinho de porco de uma tomada.
Assim sendo, se somente 8% de
nós, brasileiros, têm condições reais de interpretar o cenário político de nosso
próprio país, e de avaliar com clareza nossos candidatos, que democracia é esta
que nós temos por aqui?
E vou adiante: de quem é a
culpa pelas nossas evidentes limitações intelectuais? Certamente não é só nossa,
e diria até que nós somos os menos culpados pela nossa própria estupidez.
A responsabilidade passa, sim,
pelos nossos governantes – desde os primórdios do Brasil Colônia até hoje. Foram
sucessivos governos que jamais se preocuparam em nos tirar da ignorância
suprema. Que nunca investiram em escolas, e na profissionalização de nossos
educadores; muito, muito pelo contrário. Governantes que deliberadamente nos mantêm
a base do pão e do circo, sem saúde, sem educação, sem segurança, alimentando e
sustentando um projeto de pobreza e ignorância social – dois fatores essenciais
para que chegássemos exatamente onde estamos hoje: sentados perplexos em nossos
sofás, ouvindo nossos deputados vomitando baboseiras ao vivo e em rede nacional.
Não há golpe contra a
democracia porque, na prática, nunca houve democracia. Não de forma plena e
real. Porque somos mantidos em cárcere intelectual por diferentes governos e governantes,
que jamais quiseram que nós aprendêssemos a pensar.
Por isso somos politicamente
bebês. Por isso vendemos nosso voto, rimos de nossos corruptos, esquecemos em
quem votamos, e achamos normal ter internet gato.
Naquele domingo, dia 17 de
abril de 2016, eu entendi o quanto nossa democracia é frágil, falsa e perigosa.
Afinal, sempre que escolhemos os nossos representantes através do voto direto,
estamos escolhendo entre os escolhidos. As cordinhas que nos manipulam têm mais
de 500 anos, amigos, e não possuem lado, bandeira ou partido.
E respondendo a pergunta que dá
título a este texto: não. Nossa democracia não é democrática. Não em um país
onde somente 8% da população é capaz de diferenciar um focinho de porco de uma
tomada.